Aquando do diagnóstico, encontrar outras pessoas afectadas
pelo cancro como nós pode ser difícil. Chegar a essas pessoas pode ser ainda
mais difícil. Mas se no hospital, um grupo de apoio (havendo-os) ou online, há
o potencial de amizades que nunca teriam existido sem o cancro, então é isso
que os torna tão especiais.
Parte de ser diagnosticado com cancro é estar a receber
uma rede social que nunca se quis. Deixem-me explicar. Eu fui diagnosticado com
Cancro de Mama há menos de dois anos com 37 anos de idade. Até esse ponto eu
não tinha amigos que soubessem o que eu estava a passar. Não me interpretem
mal, eu tenho amigos incríveis. Alguns amigos estiveram a meu lado a cada passo
do caminho. De algum modo, eles não eram o suficiente. Faltava algo.
Nenhum dos meus amigos compreendia completamente os medos
que se formavam no fundo de mim, aqueles que me mantinham acordada à noite.
Perguntas como: irei sobreviver para ver os 38 anos? Como será a quimioterapia?
A cirurgia vai doer? Será que vou me recuperar e ser novamente eu?
Depois de admitir que me sentia perdida no meio de
livros, artigos de internet, profissionais médicos, sonhando com grupos de
apoio inexistentes e bombardeada por histórias de Avós e Tias Avós que morriam
de Cancro de Mama... lá me resignei! – Não é isto que preciso!!!
Necessitava de pares, de pessoas que fossem como eu me
sentia: pessoas jovens, fortes, positivas e capazes, eu precisava de
pares na minha faixa etária e se possível na minha doença! Ou seja, uma
raridade absoluta!!!
Sorte para mim, encontrei um grupo de sobreviventes
online e internacional, a maioria na minha faixa etária através do Facebook.
Eu sempre necessitei de um grupo presencial… mas, não
encontrei; e à falta de melhor comecei a entrosar naquele.
“Conheci” gentes fascinantes, lutadoras que me inspiraram
e mostraram que o que ai vinha era um caminho repleto de espinhos… mas eu sou
pessoa que odeia mentiras, soube-me bem ter o jogo aberto de inicio!
Fui recolhendo informação, sabendo as regras do cancro,
para que ele não me apanhasse na curva… e fui-me informando, ao mesmo tempo,
com os velhos livros, artigos da internet e profissionais de saúde (que por
vezes pouco sabem da vida real).
Fiz amigas, umas para a vida… vi muitas recidivarem,
outras padecerem. Celebram-se Cancerniversários e exames limpos. Nascimentos e
casamentos pós tratamentos. Vivemos na sombra de uma doença grave, mas sabemos
bem aproveitar o 2º acto que nos foi dado na vida, nalguns casos… já 3º ou 4º…
Quando em Copenhaga, na Conferência da ESMO no meu treino
como Patient Advocates de Breast Cancer e percebi que eram todas sobreviventes
do cancro da mama, e a maioria tão ... jovens… que apesar das mazelas que
confessavam (algumas já com metástases até) pareciam, saudáveis, pensei:
- Estas mulheres sobreviveram ao Cancro!!!
- Eu sobrevivi ao
Cancro!!!
Se não tivesse sido completamente estranho e esquisito,
eu teria-me ajoelhado naquele instante e beijado o chão; cheguei a chorar lágrimas de
alegria. Durante uns minutos nenhuma de nós
sequer abriu a boca para compartilhar as suas histórias. O momento era
grande e importava.
Por minutos, olhando umas para as outras, apenas
visualizámos a Esperança!
Após batalhar para chegar àquele momento recebi o que
sempre precisei. O que eu fui fazer à Dinamarca foi tornar-me numa Patient
Advocate, sim! Mas acima de tudo, foi voltar ao inicio do processo. Fui buscar
o meu sentimento de pavor, de incapacidade, de solidão e resgatei-o para aquele
momento.
Ali eu, com o meu diagnóstico; ali eu tantos kms depois,
tantos meses depois, tratada, sobrevivente dum cancro; ali eu, finalmente
acompanhada pelos meus pares!
Finalmente não estava só, pertencia a algo maior!
Depois de tanto procurar, consegui sentir, estar junto e
partilhar a emoção com outras doze jovens adultas sobreviventes como eu… Com
vidas interrompidas, com corpos com formas diferentes das originais, com filhos
umas, outras a quem o cancro as privou dessa experiência…
Estávamos ali (e outras pessoas se juntaram também), e
foram 4 dias que me curaram a alma!
O tempo foi passando e ainda não saiu de mim o desejo de
criar um grupo de apoio presencial a quem sofre desta doença. Não quero que uma
mulher tenha que batalhar tanto como eu fiz para conseguir chegar àquela
conexão especial que ninguém mais pode entender.
O melhor dos grupos de apoio, é que cada uma de nós é tão
diferente - origens diferentes, crenças diferentes, vidas diferentes - que
custa a crer que, fora das redes do Cancro, alguma de nós teria se encontrado e
se tornado amiga.
Actualmente já participo em mais grupos, que não
exclusivamente da minha doença especifica e encontrei-me pessoalmente com
outras sobreviventes, o que é para mim, sempre um presente fantástico. Sinto-me
abençoada e inspirada quando conheço pessoas a quem a doença não tira a faisca
de viver e que mesmo assoberbadas lutam, lutam, lutam e nunca baixam a guarda!
Os meus sentimentos são algo mistos, sobre as muitas
mulheres que encontram os grupos de
apoio online que frequento. Entristece-me o visível numero crescente de pessoas
de mulheres com a doença, e também estou grata que elas encontrem o tipo certo
de apoio. Gosto tanto de ver as amizades do grupo começar a ser ser saudável de
novo, a namorar, casar, ter bebés e adoptar bebés. Há também o lado mais
difícil. Eu perdi algumas amigas, ou outras voltam a passar por processos
horríveis novamente… Em amizade estamos cá para nos apoiarmos!
É tudo parte da rede social do Cancro e da louca aventura
chamada Vida.
Todos nós sabemos o quanto o Cancro pode roubar. É uma
lista gigante.
No entanto, há algumas coisas nesta minha viagem do
cancro das quais eu nunca desistiria, e são minhas relações do cancro: aquelas
amigas incríveis que eu fiz ao longo do caminho, as amigas que estão aqui
comigo hoje!
As mulheres me inspiraram e ensinaram que sim, podemos
lutar!
Sem elas, o Cancro teria juntado o sentimento de Esperança
à lista de coisas que me roubaram, mas com os exemplos que tive, fui imunizada
e armaram com confiança, segurança e unidade. Mesmo que tenha acontecido sob
circunstâncias menos do que desejáveis, Eu tenho que agradecer ao Cancro, por tantos
soldados à minha volta, tão queridas, fortes e com boa vontade!
Pensando bem, às vezes acho que esta irmandade foi o
melhor que me podia ter acontecido e o pior que podia ter acontecido ao Cancro…
Porque Juntas somos sempre mais fortes!